Civil e EmpresarialDIRETRIZES ANTECIPADAS DE VONTADE REGISTRAM AUTONOMIA EM VIDA

16 de setembro de 20250

                                                                                                                                                                                                                                                                                     Freepik

 

O respeito à vontade do indivíduo é pilar do Estado democrático de Direito e deve alcançar todas as fases da vida, inclusive a terminalidade. Diante de avanços médicos capazes de prolongar artificialmente a existência, ganha relevância assegurar que a autonomia da pessoa prevaleça mesmo quando ela não puder se manifestar.

Nesse cenário, surgem as Diretrizes Antecipadas de Última Vontade (DAVs) — também chamadas de “testamento vital” — como instrumento de planejamento existencial.

As DAVs não se confundem com o testamento civil, que trata apenas da destinação de bens após a morte. Ao contrário, produzem efeitos em vida, orientando condutas médicas quando o paciente não puder mais se manifestar e permitindo, inclusive, a indicação de uma pessoa responsável por cuidados básicos. São, portanto, instrumentos distintos, mas que se complementam dentro de um planejamento sucessório e pessoal mais amplo.

Fundamentação normativa no Brasil

Embora não exista lei federal específica, as Diretrizes Antecipadas de Vontade têm respaldo em normas já consolidadas. A Resolução CFM nº 1.995/2012 vincula os médicos ao cumprimento do documento, enquanto a Constituição assegura a dignidade da pessoa humana, a liberdade individual e o direito à saúde. O Código Civil (artigo 15) reforça a autonomia ao proibir tratamentos sem consentimento, e o Estatuto da Pessoa Idosa garante respeito às escolhas, sem limitar o alcance do instituto.

As DAVs não se destinam apenas a idosos ou pessoas em estado terminal. Qualquer adulto capaz pode elaborá-las preventivamente para assegurar que suas escolhas sejam respeitadas, caso não possa expressá-las no futuro. Trata-se de um instrumento de autonomia aplicável a todos — jovens ou idosos, saudáveis ou enfermos — e não apenas a quem já enfrenta a proximidade do fim da vida.

Forma do instrumento

Não existe uma forma única prevista em lei para fazer uma DAV. Na prática, é possível optar pela escritura pública em cartório, que garante maior segurança e preservação do documento, ou por um instrumento particular com firma reconhecida, que também é válido, mas pode gerar questionamentos. Além disso, é recomendável que a DAV seja registrada no prontuário médico para que a equipe de saúde tenha acesso imediato às escolhas do paciente.

Embora existam diferentes caminhos, é importante destacar que um documento mal redigido pode ser considerado inválido ou simplesmente não produzir efeitos na prática. Por isso, contar com a orientação de um advogado especializado é fundamental para que a DAV seja elaborada de forma clara, juridicamente correta e seja efetivamente respeitada no momento em que for necessária.

Paralelos internacionais

A discussão sobre diretrizes antecipadas de vontade não é exclusiva do Brasil. Nos Estados Unidos, existem a living will e o advance directive, regulados em nível estadual, que permitem ao indivíduo definir previamente quais condutas médicas deseja aceitar ou recusar, muitas vezes acompanhados do health care proxy, figura semelhante a uma procuração para designar quem tomará decisões de saúde em seu nome.

Já na Itália, a Lei nº 219/2017 instituiu as chamadas disposizioni anticipate di trattamento (DAT), conferindo plena eficácia às diretivas registradas em cartório municipal e obrigando os profissionais de saúde ao seu cumprimento.

Esses exemplos internacionais demonstram que o reconhecimento da autonomia individual diante da terminalidade da vida é uma tendência global, variando apenas a forma institucional de registro e execução.

Motivos para estabelecer diretrizes antecipadas

Estabelecer Diretrizes Antecipadas de Vontade é uma forma de assegurar que decisões fundamentais sobre a própria saúde e condução de aspectos básicos da vida, e até mesmo controle financeiro, não fiquem ao acaso.

O primeiro motivo é a autonomia e dignidade, já que o documento garante que a pessoa não seja submetida a tratamentos que rejeita e que sua vontade seja respeitada até mesmo em situações de incapacidade. Além disso, contribui para a redução de conflitos familiares, evitando disputas dolorosas em momentos de fragilidade emocional.

Outro aspecto relevante é a segurança dos médicos, que passam a contar com orientação clara, afastando dúvidas e possíveis responsabilizações. Por fim, as DAVs representam um planejamento integral da vida, pois complementam instrumentos patrimoniais e sucessórios, oferecendo um cuidado mais amplo e coerente com os valores e escolhas pessoais de cada indivíduo.

Considerações finais

As DAVs representam verdadeiro exercício de cidadania, ao assegurar que a liberdade individual seja respeitada até a fase final da existência.

O Brasil caminha em sintonia com a tendência mundial de valorização da dignidade da pessoa humana, ainda que falte legislação específica. Contudo, para que esse instrumento tenha efetividade, é essencial que seja corretamente elaborado, respeitando forma e conteúdo adequados.

Frisa-se, um documento mal redigido pode não produzir os efeitos desejados, tornando imprescindível a orientação de um profissional especializado. Trata-se, portanto, de uma ferramenta que merece não apenas maior divulgação, mas também a adoção consciente como parte do planejamento sucessório integral.

Fonte: CONJUR artigo de autoria da advogada Beatriz Martins Degrossi.

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