Freepik
As recentes mudanças nas regras de hospedagem, especialmente a adoção da diária de 24 horas com até três horas adicionais para limpeza, trazem repercussões diretas para a gestão hoteleira, os contratos de consumo e o compliance de dados. A norma redefine a precificação, a logística operacional e as responsabilidades contratuais dos meios de hospedagem, exigindo ajustes estruturais para manter a lucratividade e reduzir riscos jurídicos.
O impacto empresarial da diária de 24 horas é imediato. A nova rotina altera turnos de governança e a logística de quartos, reduz a flexibilidade para reacomodações no mesmo dia e pode demandar reajustes tarifários e revisão do mapa de ocupação. Isso porque a norma determina que o preço da diária já inclua até três horas de limpeza, afetando diretamente os custos e a formação de preços.
Além disso, a obrigação de informar horários e tempo de higienização adquire caráter contratual e gera novos riscos. Essa exigência transforma os termos de reserva em verdadeira obrigação pré-contratual — falhas na informação podem configurar práticas abusivas, gerar reclamações de consumidores e fundamentar ações por descumprimento contratual. Por isso, a comunicação deve ser formalizada tanto na confirmação da reserva quanto nas políticas públicas do estabelecimento.
Outro desafio relevante está na adequação ao compliance com a FNRH Digital e com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). O cumprimento dessas normas exige controle rigoroso sobre a coleta, o armazenamento e o acesso aos dados pessoais dos hóspedes, observando os princípios de minimização, finalidade e segurança. Hotéis e pousadas devem firmar contratos específicos com fornecedores e plataformas (como o Serpro) e adotar medidas técnicas como criptografia, registros de logs e controle de acesso. A integração à FNRH Digital também impõe revisão de fluxos internos e dos termos de privacidade.
No tocante à cobrança por early check-in e late check-out, é fundamental que o serviço seja estruturado como opcional, informado e aceito de forma expressa no momento da reserva. A precificação deve ser transparente, proporcional ao tempo adicional e devidamente registrada em contrato ou recibo, evitando cláusulas-surpresa e práticas discriminatórias. A documentação e a comunicação prévia são essenciais para reduzir o risco de autuação ou de devolução por cobrança indevida.
As adaptações contratuais e operacionais tornam-se inevitáveis. É necessário atualizar termos de reserva com horários fixos, políticas de limpeza e cobranças adicionais, além de treinar as equipes de recepção e governança. A implementação de checklists padronizados de higienização, a integração com a FNRH Digital e a formalização de contratos com agências e plataformas (OTAs) para padronizar o fluxo de informações são medidas urgentes. Recomenda-se, ainda, registrar todas as comunicações com o hóspede, por e-mail ou ata, como meio de prova.
O equilíbrio entre o novo padrão regulatório, a eficiência operacional e o controle de custos exigirá gestão estratégica. Padronizar procedimentos conforme o perfil de cada estabelecimento, utilizar indicadores de produtividade da governança e priorizar insumos com melhor custo-benefício são práticas que contribuem para a sustentabilidade do modelo. As cortes devem, contudo, preservar os requisitos mínimos de higiene, sob pena de multas e danos reputacionais.
Impactos na receita e na segurança jurídica
Do ponto de vista financeiro, as novas regras impactam diretamente a liquidez e a previsibilidade de receita. O aumento dos custos operacionais, aliado à redução do turnover intradiário, pode afetar o fluxo de caixa e exigir reajustes tarifários e novas ferramentas de revenue management, especialmente em empreendimentos com margens de lucro mais estreitas.
Por fim, há um componente central de segurança jurídica e competitividade. O cumprimento das novas diretrizes fortalece a previsibilidade e oferece defesa regulatória em eventuais fiscalizações. Por outro lado, a ausência de adaptação eleva o risco de ações consumeristas e administrativas. Políticas documentadas, compliance jurídico e treinamento de equipe são, portanto, indispensáveis para mitigar litígios e preservar a reputação empresarial.
A mudança regulatória não deve ser vista apenas como um desafio, mas como uma oportunidade para profissionalizar processos, reforçar a transparência e aprimorar a experiência do consumidor. Em um mercado cada vez mais competitivo, a conformidade será, também, um diferencial estratégico.
Fonte: CONJUR – matéria de autoria da advogada Betânia Miguel Teixeira Cavalcante


